quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Barrados na Vila

Dorival Jr. foi a última vítima de uma tragédia anunciada.
Há exatamente 7 dias, Neymar protagonizava um divisor de águas para a carreira dele, e com certeza do então comandante.

Muito se falou da atitude de indisciplina do garoto de 18 anos, que xingou o técnico, companheiros e membros da comissão técnica.
Pois bem. Após este episódio, Neymar foi tachado por muitos de mimado, abusado, arrogante, prepotente, entre outros adjetivos.
Eu vejo da seguinte forma. O atacante exagerou. Foi mal-criado. Rebelde. E justo com aquele, que sempre o defendeu.
Porém, crucificá-lo é demais.
Mas, é como dizem por aí, a vida é feita de escolhas.

E Neymar fez a dele, ao enfrentar o comandante. Mesmo sem motivo.
Dorival Jr., se sentiu como um pai que recebe uma resposta atravessada de um filho ingrato - como o volante Roberto Brum, destacou na coletiva após o episódio contra o Atlético-GO.

Ao longo destes 9 meses, em que dirigiu o Santos, em todas as entrevistas, e em várias polêmicas protagonizadas pelo camisa 11, eu vi um técnico que era muito mais do que o chefe. Era o pai. O amigo. O aliado.
Ele defendeu a jóia santista com unhas e dentes. Sempre.
Mesmo nos momentos, em que sabia que Neymar havia exagerado.
Mas, ao ser insultado e xingado com palavras que não posso reproduzir, na última quarta-feira, Dorival Jr., sentiu que era hora de intervir. De punir.

A multa em 30% do salário e a ausência da partida contra o Guarani, foram às primeiras medidas.
Aí entra a linha de fogo.
Deixar o atacante fora de um jogo teoricamente fácil, com todo o respeito ao Bugre, podia ser pouco.
Tirar Neymar do clássico contra o Corinthians, poderia ser demais.
Na balança, apenas uma coisa em questão: o bem do jogador.

Dorival, ao anunciar a ausência do camisa 11 do jogo contra o Timão, não só comprou briga com a torcida, e talvez, tenha aguçado a ira do jogador. Como viu o próprio emprego estar ameaçado.
Mas, para aquele que quer o bem, isso pode ter valido a pena.
Ele sabia que de certa forma, Neymar precisava ser protegido, acolhido.
Mas isso se reverteu contra os dois.

Não acredito, e nem quero crer, que um jogador, um futuro craque, possa ter o poder de derrubar um técnico, e justo aquele, que puniu para ensinar.

Mostrar que tudo na vida deve ter limites.
 Não podemos sair xingando a tudo e a todos por aí, e ficar tudo bem.
Dorival não quis ser autoritário.
Muito pelo contrário, quis impor limites, sim. Mas, de uma maneira positiva.
Mostrar que quando alguém erra, no mundo adulto, deve ser repreendido para aprender, e ver que no futuro, é preciso pensar duas vezes antes de tomar tal atitude.

De uma forma ou de outra, acho que Dorival teve êxito.
Pois agora, a responsabilidade se voltou para o mesmo Neymar, que conquistou a admiração de todos nós, nos encanta com a bola nos pés. E agora, decepcionou aos mesmos que abrem a boca para narrar, reportar e contar sobre suas belas jogadas.

Tenho certeza que o jovem pode se considerar uma pessoa plenamente feliz.
Afinal, quem tem apenas 18 anos e já ganha cerca de 600 mil reais por mês.
Tudo bem que dinheiro não traz felicidade, mas com certeza, ajuda a construí-la.
Quem tem 18 anos e como jogador, conquistou 2 títulos em 9 meses.
Com certeza, ninguém.
Ou seja, ele é sim um privilegiado, diferenciado. Em vários sentidos.
Só que toda esta felicidade, agora está virando para o lado negativo.
Ah, tenho certeza que se Neymar pudesse ter pensado 2 vezes antes de ter xingado Dorival, ele o faria.
Nenhum chapéu, lençol, firula ou qualquer outro drible com os pés, teve mais repercussão do que as palavras proferidas pela boca dele.

O garoto que tinha tudo, agora pode perder muito.
O respeito daqueles que o aplaudem.
A compaixão daqueles que sabem que é difícil ter 18 anos e toda esta responsabilidade nas costas.
Espero estar errada.
Mas acredito, que nem mesmo Neymar, imaginara que ao mandar Dorival para aquele lugar, ele mesmo poderia estar indo de encontro com a ira de muita gente, que apenas quer vê-lo encantar o Brasil e o mundo com seu belo futebol.
Tomara, que o jovem que protagoniza este cenário de títulos, fama e dinheiro, não caia no que de pior pode acontecer: o desprezo e o desrespeito de companheiros, torcedores e adversários.

Ele errou, pediu desculpas, e agora pode ser responsabilizado por uma decisão da diretoria, que ao escolher seu craque, pode ter transferido para o mesmo, a culpa da queda do treinador.
Dorival Jr., injustamente demitido, pode ser que tenha se livrado de um problema.
E de cabeça erguida. Ele protegeu. Acolheu. Ensinou. Orientou.
E quando repreendeu, fez o que qualquer um de nós faria. Reagiu.
Mas, não reagiu de maneira agressiva, e sim sensata, ao apontar o erro.

Infelizmente, ele saí após fazer tanto para um clube, que viu um time encantar o país.
Quem não desejava o "time dos sonhos" como o Peixe era chamado no primeiro semestre.
Seus craques comandados por Neymar, Ganso, Robinho e André fizeram história.
E vão ficar nela para sempre.
O ataque de mais de 100 gols. Dois títulos em 9 meses.
Invejado e ao mesmo tempo, admirado pelos outros clubes.
Isso ninguém vai esquecer.
Mas nada na vida real, é perfeito. Tudo tem um começo, meio e fim.

Pois bem, como o próprio Dorival havia dito “a magia acabou".
E não pelo desmanche da equipe, que perdeu André, Robinho e Wesley - vendidos e Ganso, machucado.
O encanto acabou quando a escolheram a jóia e descartaram o ourives.

Dorival, o homem que sempre tratou Imprensa, jogadores, comissão técnica, torcedores e acredito que até a própria diretoria com respeito, viu o sonho de continuar uma bela história, pelo menos, com ele no comando, acabar.
Pode ser que 2010, não fique marcado só pelos craques, títulos e números impressionantes do Santos FC.
E sim, pelo dia em que um jogador derrubou o técnico.
Pelo garoto, que poderia protagonizar um grande ato de rebeldia e brigar pelo "pai" que sempre acolheu o filho.
Não, pelo herói que virou vilão.

E se o fim da magia que Dorival falava chegaria logo, tenho certeza que ele não imaginara que a sua maior estrela, pudesse começar a apagar o próprio brilho, e também o da equipe santista.
Mais do que "barrado na Vila", Dorival Júnior saí com a certeza que todo pai sente ao ensinar o filho ao longo da vida. Que para tudo há uma escolha.
A dele foi proteger Neymar, da fúria dos companheiros, dos adversários e dos torcedores.
A do atacante, ainda não sabemos.

Mas, agora sem o maior tutor, quem será que vai defender o jovem da possível responsabilidade de protagonizar não só o time dos sonhos, mas sim, a equipe que hoje está sem comando.
E se houver um revés no clássico desta noite, por exemplo, o camisa 11 pode começar a levar nas costas o fardo de fazer o time perder não só a referência, como o porto seguro de todos os problemas: Dorival Júnior, o técnico que sai da Vila Belmiro, com a sensação de dever cumprido, com o Santos e principalmente, com Neymar Júnior.

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